A história da artesã e empreendedora Joana Barbosa de Aguiar, 42 anos, de Piraquê (TO), passa por dez cidades, sete empregos, dois relacionamentos sérios, dois nascimentos e um reencontro.

Nessa caminhada tem causa feminista, lágrimas, risadas e empreendedorismo.  Parece até roteiro de novela, mas é a vida de uma mulher que não parou muito pra pensar nas mudanças. “Não sobrava tempo pra esse tipo de luxo.”

De viajante a liderança comunitária, hoje ela é referência em um dos negócios apoiados pelo Programa ReDes no Tocantins. Como coordenadora do núcleo de Piraquê na Cooperativa Multifuncional da Economia Solidária (Coomesol), Joana se encontrou no artesanato e no cooperativismo. O interessante é que isso tudo ainda é novo até pra ela: a cidade escolhida para morar com os dois filhos, o trabalho com as mulheres e o ReDes começaram juntos há três anos, mas ela já andava tentando se achar havia mais de 20.

Andanças

Filha de pai garimpeiro e mãe costureira, Joana não teve muita escolha em relação ao tipo de lar que teve na infância e adolescência. A estrada era a única saída quando o ouro do barranco acabava e, por muitas vezes, ela, os pais e um irmão fizeram as malas para explorar outros lugares. Ela nasceu em Formoso do Araguaia (TO), mas foi em Guaraí (TO) que passou a maior parte desse período, o que tornou a cidade uma espécie de base para a família.

Sobre essa fase, ela tem só uma reclamação a fazer: na vida de viajantes que levavam, os estudos acabaram prejudicados. “Era difícil ficar na escola. Cheguei até o Ensino Médio com 17 anos, mas só consegui terminá-lo mesmo com 32, pelo EJA (Educação de Jovens e Adultos). Não por falta de empenho e vontade, porque sempre gostei de aprender, mas porque era hora de partir ou por causa de relacionamento e de filho”, conta.

Sobre os relacionamentos, esse foi outra questão que influenciou e fortaleceu suas lutas. Quando moravam em Crixás (GO), seu pai resolveu ir para o estado de Rondônia garimpar e foi sozinho dessa vez. Após essa partida, Joana ficou oito anos sem ter notícias dele. Com 25 anos, quando se virava como secretária e faxineira com a mãe, resolveu que era hora de procurá- lo.

Esse foi o reencontro e o encontro de Joana: se entendeu com o pai, conheceu um garimpeiro e resolveu que Rondônia entraria para sua lista de residências. Desse relacionamento, nasceu Alexandre, sua primeira preciosidade. “É engraçado como o garimpo me trouxe coisas ruins, mas também coisas muito boas. Acabei me envolvendo com uma pessoa que também vivia disso e ganhei meu filho. Só Freud explica essas relações”, comenta rindo.

A história terminaria bem aqui não fosse pelo fato do pai de Alexandre ter deixado Joana ainda grávida. Sem tempo para chorar, era hora de mudar novamente, pensar em outra profissão e se reinventar. Foi com a mãe para Guaraí, onde trabalhava como auxiliar de enfermagem e fazia faculdade de pedagogia com bolsa do ProUni. Pausa mais uma vez. Joana voltou com um ex-namorado, montou uma pequena lanchonete com ele e teve a Giovana.

Tudo se repetiu, seu parceiro foi embora, e desse segundo relacionamento Joana ficou com a filha, o tino para o empreendedorismo e a vontade de empoderar mulheres, “para que não fossem dependentes de situações como a que eu tinha passado”. Sua saga pessoal foi essencial para a liderança que já era construída durante esse tempo todo.

Piraquê e o ReDes

A chegada a Piraquê aconteceu em 2012. Antes disso, Joana estava em Araguaína, cidade vizinha, onde tem tios e primos.Lá, ela cuidou da mãe doente, trabalhou em casas de família e a noite fazia churrasquinho para complementar a renda. Cansada da rotina agitada, Piraquê, com cerca de três mil habitantes, foi a escolha para se fixar e ter tempo.

“Comecei minha nova vida vendendo roupas usadas, que os amigos doavam pra me ajudar, e fui percebendo a cultura do lugar. Eu queria tranquilidade e de repente eu tinha muita. As outras pessoas também porque sempre o mesmo grupo de mulheres estava papeando do lado de fora de suas casas, muitas vezes lamentando a falta de emprego e de oportunidades. Foi aí que pensei: a gente bem que podia se unir.” Joana mal havia chegado na cidade e sugeriu a criação de uma associação.

Surgiu assim a Associação de Mulheres Empreendedoras de Piraquê, com 12 integrantes animadas em transformar a matéria-prima da região em arte. Daí para entrar no ReDes foi um pulo. Joana já estava “arretada e com a corda toda” para alavancar o projeto que ia mudar a vida das mulheres de Piraquê. Se uniram a Xambioá e Araguaína e formalizaram a Coomesol.

Com o apoio do ReDes, o grupo de 50 pessoas está focado na implementação de uma fábrica de óleo de babaçu e no desenvolvimento dos núcleos artesanais com capacitações e suporte em gestão. Joana não cabe em si de felicidade com essas conquistas e agora, finalmente, tem um lar bem formado e uma única profissão.

“Achei o que mais gosto de fazer que é me envolver no cooperativismo e criar peças. No fim, foi bom ter ido atrás do meu pai, que hoje vive comigo e meus filhos, foi bom ter cuidado da minha mãe quando pude, e foi bom não ter terminado a faculdade de pedagogia porque hoje minha área é outra. Encontrei depois de tanto andar por aí minha causa de luta e meu lugar.”